26 de dezembro de 2009

Leonilson, um presente de Natal

No meu post natalino venho trazer a todos este maravilhoso e corajoso artista. Escrevi este texto durante meu curso na Guignard em novembro de 2008.



Leonilson 1957-1993

Leonilson foi um marco na década de 80 seu trabalho discute sobre uma das grandes discussões da época, a questão do prazer e da sexualidade. Seu trabalho partindo de uma plataforma pessoal tem um discurso muito válido para o âmbito da arte, sobretudo no final da década de 80 e início dos anos 90.
Voilà Mon Couer consiste num pedaço de lona pintada de tinta acrílica dourada, e vinte e seis pingentes de cristais lapidados, sobras de um candelabro quebrado. Leonilson oferece seu coração para o espectador, tão frágil, podendo ser estilhaçado como cristal.
Essa obra expõe de forma clara o cunho pessoal do trabalho de Leonilson e a forma como ele estava disposto a colocar seus medos, sentimentos e esperanças a mostra.
O trabalho de Leonilson fala sobre sua vida e sua morte. Em uma época em que a doença que o matou devastou o mundo.


Voilà Mon Couer

“Talvez mais do que o corpo, o coração seja o motivo dominante e recorrente da obra. O coração como órgão muscular, bombardeador de sangue através de veias e artérias; o coração como centro vital das emoções e sensibilidades do sujeito, repositório de seus sentimentos mais sinceros, profundos e íntimos. Abismos, águas, ampulhetas, âncoras, asas, átomos, crucifixos, desertos, escadas, espadas, espelhos, espirais, facas, flores, fogos, globos, homens, ilhas, labirintos, livros, mapas, matemáticos, montanhas, oceanos, olhos, órgãos, pedras, pérolas, poesias, pontes, portos, radares, relâmpagos, relógios, rios, ruínas, tempestades, templos, vulcões - tudo remete ao coração (do artista), seja atravessando-o, seja por seu intermédio, seja a partir dele.”
Adriano Pedrosa

Saiba mais sobre o artista e o projeto póstumo criado por seus amigos e familiares:
http://www.projetoleonilson.com.br/

JFBrittes

25 de dezembro de 2009

a ceia

a princípio optei por formular uma postagem no lugar que eu estivesse localizada. ontem vim para a bahia, e com todas adversidades fui levada pela maré a escolher um poeta marginal/ nascido no piauí para lhes apresentar. esta escolha se configura para mim, como forma de um presente, nesta data muito especial para alguns e nada diferente para outros. eu tenho gosto pela margem, pela poesia múltipla que se manifesta fora da possibilidade de ser arranjada e enclausurada em categorias e formulações. e é exatamente por este motivo, que irei conter meu discurso para dar à fala, a força do verbo disforme. uma dose de poesia é o alimento vital que agora compartilho. ceiar é partilhar o bom poema e nada mais.



Cidadão Comum

por Torquato Neto em 09-08-1962


Cidadão Comum

Sempre subindo a ladeira do nada,

Topar em pedras que nada revelam.

Levar às costas o fardo do ser

E ter certeza que não vai ser pago.

Sentir prazeres, dores, sentir medo,

Nada entender, querer saber tudo.

Cantar com voz bonita prá cachorro,

Não ver ‘‘PERIGO’’ e afundar no caos.

Fumar, beber, amar, dormir sem sono,

Observar as horas impiedosas

Que passam carregando um bom pedaço

da vida, sem dar satisfações.

Amar o amargo e sonhar com doçuras

Saber que retornar não é possível

Sentir que um dia vai sentir saudades

Da ladeira, do fardo, das pedradas.

Por fim, de um só salto,

Transpor de vez o paredão.



(mariana de matos)

24 de dezembro de 2009

jairo ferreira: cinepoeta

Jairo Ferreira, escritor de Cinema de Invenção (primeira edição da Max Limonad, em 1986, reeditado pela Limiar, em 2000), foi também cineasta, jornalista, fotógrafo e ator.
Cinema de Invenção nasceu com o propósito de avaliar a partir de um todo o cinema
marginal/experimental/udigrudi, ou na linguagem do autor, o cinema de invenção.
Desde sua primeira edição já se consagrou como uma de nossas principais obras bibliográficas sobre o cinema brasileiro. Não se trata de um estudo acadêmico, preocupado com referências, problematizações e conclusões e sim um ensaio crítico e poético onde o leitor é instigado a devorar a filmografia do ciclo Boca do Lixo, de nomes já consagrados como Reichenbach e Sganzerla – até os menos conhecidos como Agripino de Paula e Calasso.


 Textos de Jairo em: cinema-de-invencao.blogspot.com


Paula Motta

manifesto do cinema de invenção


I
Cinema de Invenção é Cinema do Novo Aeon
Todo cineinventor e toda cineinventora é uma estrela.
Constelação cósmico/cômica da Errância.
II
A primeira carta do Tarot é o mago: cinemagia.
Big-Bang. Akasha. Quintessência.
Pré-estréia: Precessão dos Equinócios.
III
Cinema de Invenção é Tradição.
O que está em cima é como o que está aqui.
Lei de Thelema
IV
Minha alegria é ver a sua alegria.
Amor sob vontade.
418: ABRAHADABRA
V
A anarquia é a prova dos nove.
Cinevida: sonho.
555. Energia.
VI
Cinemúsica da luz: Samadhi.
O equilíbrio entre o significante e o significado.
666. Raio de luz.
VII
Cinema do (G)rito. Cinema (Nô)made.
Novas percepções no horizonte do (im)provável.
AUM: OM
VIII
A verdade digital a 24 quilates por segundo.
Cinema parabolicamente visionário.
Work in progress.
IX
Cineanônimo
Atípico. Inominado.
Iluminado.
X
Cinemastral.
Tu não tens nenhum direito a não ser fazer o que quiseres.
Tetragrammaton
XI
Cinema é Amor.
Cinema de Invenção
Sagrada Diversão




Manifesto de Jairo Ferreira

23 de dezembro de 2009

Hoje eu decidi falar da arquitetura, de forma livre, sem precedentes de academia e de teoria. Vou falar dessa arquitetura que a gente vive no dia a dia na cidade.

Que esta em todos os lugares, nas ruas, nas calçadas, nos prédios, nos monumentos, e que influencia diretamente no nosso humor.

É verdade. Pode parecer que eu estou exagerando, mas a seguinte vocês irão entender do que eu estou falando. Tem coisa mais agradável do que caminhar tranqüilo, por uma calçada larga, com arvores sombreando, um bom vento passando... hmmm tem?

Agora imagina o quão desagradável é, - essa vai ser fácil para os que moram em capital, passar por uma rua muito movimentada, andar em uma calçada larga porem cheia de vendedor ambulante, gente se esbarrando, o sol e o vento totalmente bloqueados pelos prédios muito altos... Ah. Já fiquei nervosa só de lembrar.

O que eu quero fazer vocês entenderem é que a arquitetura e o urbanismo são muito mais comuns na nossa vida do que podemos imaginar. Por isso devemos sim criticar. Assim como criticamos quando vemos um filme que não gostamos, ou lemos um livro que não gostamos.

As pessoas deveriam se sentir mais a vontade para criticar a arquitetura. E essa é uma dificuldade que não só os leigos têm, muito pelo contrario, os arquitetos, e principalmente os estudantes de arquitetura morrem de medo.

O fato é que a arquitetura foi colocada num pedestal uns anos atrás, e precisa rapidamente descer de lá.

A boa arquitetura devia ser disseminada por aí e cada vez mais acessível a todos.

 
 
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Gabriela de Matos.

22 de dezembro de 2009

Moda como arte?


Moda como arte?



Flávia Virgínia



Dizer da moda enquanto Arte é encurralá-la na mesma armadilha da Arte pela arte. Afinal, dar nomes aos bois parece uma forma de limitar e comunicar com alguns, que por algum motivo se sentem confortáveis ao classificar as coisas, pessoas, gêneros. Enfim, aqui não se trata disso, dizer que moda é moda, arte é arte, cadeira é cadeira. Não, a questão é pensar a força que determinadas linguagens são capazes de exercer. Não que as ferramentas para dizer sobre algo não seja importante. Ao contrário, a matéria também é uma forma de comunicar e expressar o pensamento, que é uma questão para as artes, para as modas, para as pessoas. Já dizia o filósofo Michael de Certeau que vestir-se é um ato de significação por si só e isso é um acontecimento de comunicação. O simples fato de termos de nos vestir todos os dias, afinal não podemos por lei sair nus por aí, já leva qualquer indivíduo a fazer e carregar uma escolha. Já pensou o quão importante então a indumentária tem na expressão da sociedade? Ao longo dos anos, da história da moda esse fato é inegável. Movimentos e pequenas revoluções são marcados por fotografias que expressam na estética da imagem aquilo que se pretendia.


E a época atual? Certamente a estética da contemporaneidade guarda em si informações e pretensões que comunicam com os anseios ou a ausência deles dentro das sociedades atuais. E com o advento da tecnologia o uso da fotografia como forma de expressão também é um dos pontos altos dessa exposição estética. Então pensando nisso reuno algumas fotografias nas quais a indumentária carrega códigos visuais e significam a obra, o tempo, divertem os olhos e levantam questionamentos sobre o uso da imagem como simulação da vida.


Fotografias de François Coquerel (1989-) Disponíveis em http://www.francoiscoquerel.com/





Fotografias de Jaimie Warren disponíveis em http://www.dontyoufeelbetter.com/

21 de dezembro de 2009

sobre o teatro da crueldade



o Teatro da Crueldade foi idealizado por antonin artaud e tinha a intenção
de romper com o palco italiano e promover a encenação em palco de arena.
artaud queria fazer um Teatro plástico, onde todos os elementos que fazem parte
da encenação (cenário, figurino e etc) fossem elementos realmente significativos
(signos) e fossem usados para a transmissão de mensagens, da mesma forma
que a fala.
em relação ao que chamamos de interpretação, era necessário explorar todos os
sentidos humanos e assim, fazer com que os gestos, a expressão corporal,
o balbucio, o gemido, o olhar, a expressão facial (...) tivessem a mesma importância
do texto falado, até que não se necessitasse mais desse texto- até que se superrasse
a palavra articulada para atingir a Palavra (a totalidade da manifestação humana).
o primeiro Manifesto do Teatro da Crueldade foi escrito em 1932 e pretendia o teatro
que se fundisse à vida, um Teatro que se sentisse a todo o tempo, impregnado
na carne.
o livro "O Teatro e seu duplo", do artaud, contém o primeiro e o segundo 
manifestos do Teatro da Crueldade e toda sua funcional estrutura literária e filosófica
(por mais antagônico que isso possa parecer).
o Teatro da Crueldade foi materializado/encenado por artaud, influenciou várias proposições estético- teatrais e ainda hoje é legado/ação para grupos de teatro, performance e artes plásticas.


(ana pedrosa

sobre antonin artaud_ linguagem/vida


ator, dramaturgo, escritor, revolucionário (no cerne da palavra), maldito!
(como são chamadas as grandes personalidades subversivas em nossa
história): antonin artaud (1896-1948).
uma persona non grata por qualquer sistema tradicionalista de uma sociedade
burocrata regida pela moralidade.

artaud propôs mais do que uma estética abrangente e improvável, fez
desmoronar os palcos que mitificam a arte, fez destituir a obra-prima totêmica
que a afasta da cultura/civilização.

viveu do desejo, construiu a Arte impregnada na carne, uma vida pautada na arte.

artaud deixou encravado na sociedade a necessidade de um fazer artístico
que provinha do ponto mais fundo da constituição humana- da medula.
uma arte vital e transformadora, portanto, da própria vida.


se a totalidade humana é o teatro que a envolve e rege, fazer do teatro o duplo da vida-
a elevação da vida- fazer da vida um grande palco.

fecundar para renascer o Teatro que "desvenda e encanta a imensidão" 
(palavras do meu sábio amigo nordestino roberto scalia).







 (ana pedrosa

breve colocação_ a cultura/a civilização

após um texto/manifesto, venho nesse espaço, já instituído aberto, para fazer uma breve colocação sobre a cultura da qual nos alimentamos e sem a qual morreríamos de fome.
trata-se de um texto de antonin artaud, que pretendo apresentar a vocês com muito cuidado, posto meu apreço pessoal e a delicadeza que devemos dedicar para o fazer pronunciado.


Nunca, quando é a própria vida que nos foge, se falou tanto em civilização e cultura. E existe um estranho paralelismo entre esse esboroamento generalizado da vida que está na base da desmoralização atual e a preocupação com uma cultura que nunca coincidiu com a vida e que é feita para dirigir a vida.
Antes de retornar à cultura, constato que o mundo tem fome e que não se preocupa com a cultura, e que apenas de um modo artificial é que se pretende dirigir para a cultura pensamentos que se voltam unicamente para a fome.
(...)
Se o signo da época é a confusão, vejo na base dessa confusão uma ruptura entre as coisas e as palavras, as idéias, os signos que são a representação dessas coisas.
(...)
É preciso insistir nessa idéia da cultura em ação e que se torna em nós uma espécie de novo órgão, uma espécie de segunda alma: e a civilização é a cultura que se aplica e que rege até mesmo nossas ações mais sutis, o espírito presente nas coisas; e é apenas de modo artificial que se separa a civilização da cultura e que há duas palavras para significar uma mesma e idêntica ação.
(...)
Por mais que exijamos a magia, porém, no fundo temos medo de uma vida que se desenvolveria toda sob o signo da verdadeira magia.




inicialmente aqui abandono os palcos nomeados, os espetáculos diários e fechados em taxas e classes para apresentar a todos um Teatro esquecido, abandonado em sua vanguardista e revolucionária escritura. quero aqui lhes contar de um teatro tão contemporâneo e tão ausente até mesmo de nossas bibliotecas, que dirá das ocupações e trânsito que carece para sê-lo.



(...) ‘mudar a língua’ é concomitante com ‘mudar o mundo’ (...)
roland barthes




(ana pedrosa

20 de dezembro de 2009

apenas palavras

Apenas Palavras - Sulamita Cruz



No princípio era o verbo...


E o verbo se fez carne...

Sempre fui permeada de palavras. Cheia delas, e mesmo quando faltavam eu ainda era cheia disso. Vejo palavras em tudo e tudo que vejo, de alguma forma, transformo em palavras. Não me imagino de forma alguma me apoderando delas, ou as amarrando dentro de capas duras, enfim. Voltando com elas de onde elas vieram.

De repente percebi o quanto palavra emociona e o tanto de palavra que cabe dentro de mim, e por mais que tento tirá-las daqui elas continuarão palavras. De mim, só saem e entram palavras.

Assim, só me resta, com palavras tentar buscar um entendimento do meu processo artístico. Usando de palavras-chaves (de praxe) diria que essas seriam: palavra, obsessão, feminino, arquivo. Porém, vendo estas todas juntas perco um pouco o sentido. Palavras são muito vazias quando pra nominar as coisas, principalmente quando essas coisas são tudo o que sai de mim.

Não sei precisar quando essas palavras invadiram também meus desenhos, acho que sempre estiveram juntos. Tão juntos que não os vejo como coisas diferentes mais. Eles se afiguram assim.


Quando conheci o trabalho de Annette Messager entendi um pouco melhor como essas imagens podem caminhar juntas. Seus trabalhos vieram como marulhar para meus pensamentos e também para as minhas imagens. Consegui ser mais livre. Admirar tem dessas coisas. Admirar não pode ser só um verbo, não é pra mim.

admiração

s. f.

1. Sentimento agradável que se apodera do ânimo ao ver coisa extraordinária, bela ou inesperada.

2. Objecto!Objeto que causa admiração.

3. Espanto.

ponto de admiração: sinal (!) com que se nota uma expressão admirativa.



admirar

v. tr.

1. Ver com admiração.

2. Causar admiração ou estranheza.

v. pron.

3. Sentir admiração ou estranheza.



É nesse sentido que entendo verbo como carne. Quando este se mostra além de simples verbo, de simples palavra. Usando palavras da própria Annette:

“I have never started off from the basis of a color or a form , but always from a word. The word has been a trigger. I am a word thief!”

Assim é pra mim. Parto sempre de uma palavra/sentimento. Como se realmente palavras fossem gatilhos, catapultas eu diria. Sou lançada a diversos lugares a partir de um simples vocábulo. E mesmo quando eles nao aparecem literalmente, é certo que elas passaram por ali em algum momento.

Como Annette, assumo múltiplas personagens enquanto escrevo. Vivencio as experiências do que narro. A leitura me carrega pra um outro estado, pra uma certa vivência do que está sendo narrado, já quando escrevo vou construindo esse outro estado. Sai das minhas próprias mãos, e muitas vezes do meu controle.

Deste modo, não só o princípio, mas o meio e o fim são verbos. Quando uso de rolos ou da minha câmera, são os verbos que se anunciam e assumem a direção. Mesmo quando tudo acaba são eles que ficam. São eles que continuam dando sentido a tudo que está dentro do trabalho e dentro de mim.